Há diversas situações em que se verifica a não aplicabilidade da Mediação. Entretanto, a maioria delas, referem-se aos aspectos que somente podem ser verificados no transcorrer da sua realização.

A priori, temos aqueles casos descritos pela Escola de Harvard, corroborados por outros autores, onde se nota a incapacidade de o sujeito tomar uma decisão, quer seja por apresentar um transtorno emocional grave, quer por não desfrutar de uma autonomia da vontade (casos onde se sente coagido pela outra parte em função de ameaças anteriores, observados em algumas situações de violência), quer por estar sob o efeito de medicamentos (psicofármacos) ou de outras substâncias psicoativas (álcool e outras drogas).

Podemos acrescentar as situações onde não exista uma clara polarização do conflito, quando as pessoas não têm compreensão de seus pedidos e suas necessidades, ou quando não se sentem com autonomia para tomar decisões, pois dependem da vontade de terceiros que não tenham condições de participar do processo.

Consideramos outros fatores importantes para viabilizar a mediação: conforme Brandoni & al. (2004) e Entelman (2005), o mediando precisa ser capaz de assumir o conflito, ter consciência dele e se sentir impelido a resolvê-lo. Sem essa consciência e impulso, a mediação não poderá prosseguir.

Outro aspecto é a necessidade da evolução da queixa para a demanda. A queixa não envolve o sujeito na busca de soluções, mas a demanda sim. Ela impulsiona o sujeito a fazer algo para sair da situação perturbadora gerada pelo conflito. Mesmo que ela não esteja presente no início, pode ser desenvolvida pela facilitação do mediador, através de atitudes motivadoras. Sem demanda não há como mediar.

Um terceiro aspecto assinalado por Brandoni é a disponibilidade das partes para a negociação. É a mudança da rigidez para a flexibilidade, da competição para a cooperação. É aceitar o outro diferente como alguém que pode ajudá-lo a compreender o que está acontecendo. É a plasticidade psíquica como condição para tratar adequadamente o conflito, considerando que a outra pessoa no lado oposto, defendendo ideias tão diferentes, pode contribuir para uma compreensão mais ampla. A rigidez psíquica, portanto, funciona como um entrave para a negociação e, consequentemente, para a mediação, o que é frequentemente observado em Varas de Família.

 

OS LIMITES DO PROCESSO DE MEDIAÇÃO

Em primeiro lugar podemos assinalar o desequilíbrio de poder entre as partes, que é avaliado no decorrer do processo da mediação. Quando existem diferenças muito acentuadas, no que diz respeito à própria participação no processo de mediação, à capacidade de expressão e as condições do sujeito para participar de um processo que requer a habilidade para negociar, o mediador deve avaliar sobre prosseguir ou não com a mediação. Este desequilíbrio de poder não está diretamente vinculado à diferença das condições financeiras entre as partes. Dependendo da situação, esta última diferença não se constitui num fator determinante.  Ao mediador caberá manejar a situação de modo a tornar o processo igualitário e, não obtendo êxito, decidir por outra abordagem.

Analisar a natureza do conflito se faz necessário para previamente avaliar a pertinência ou não do uso do instrumento da mediação. Brandoni assinala três situações que dada à matéria ou objeto do conflito, a mediação não poderá se efetivar: os casos que envolvem questões de ordem pública; aqueles em que não se pode prescindir da resolução judicial e nos casos em que os interesses de terceiros estão envolvidos.

Além dos aspectos acima apontados, impõem-se como limite do processo da mediação outras situações, sobretudo, quando as partes não apresentam as condições necessárias para participar deste processo, tais como: falta de plasticidade psíquica; assunção de responsabilidade diante do conflito apresentado e disponibilidade para negociar; ausência de demanda; incapacidade de discernimento; impossibilidade de dar um consentimento informado, devido à falta de informações prévias sobre o tema discutido, à dificuldade de abstração e à ausência da autonomia da vontade.

Outros aspectos de ordem subjetiva, como as expectativas que as partes têm em relação a como o conflito será resolvido. Assim, se o propósito é a punição do outro há que se decidir por outro método de resolução. Do mesmo modo, se o que motiva as partes é prosseguir na disputa, no “processo de duelo”, ou se o vínculo entre as duas é de extrema destrutividade, que prevalece em detrimento do espírito de cooperação, ainda que temporário, não há como mediar.  Nesses casos, há experiências que suspendem a mediação, fazem o encaminhamento para o atendimento psicológico e posteriormente retornam para a mediação. Contudo, o processo acaba por tornar-se muito demorado.

 

O TERCEIRO FACILITADOR E O LIMITE ÉTICO

O lugar do terceiro é primordial para que a mediação possa ocorrer. Esse lugar é alcançado quando é possível refletir acerca da neutralidade e da imparcialidade do mediador. Embora esses conceitos sejam complexos e devam ser considerados, é preciso analisá-los através de uma abordagem crítica, a fim de não recair no tecnicismo, isto é, no puro domínio da técnica e numa atuação mecânica por parte daquele que pretende ocupar esse lugar. Partimos do princípio que sempre haverá um envolvimento do mediador com as partes envolvidas no conflito. Desenvolver empatia, ter um genuíno interesse pelas pessoas que estão naquele momento litigando, ouvir de forma atenta para legitimar o que se diz, tudo isso implica num envolvimento do mediador com os mediandos. Esses aspectos mostram que a necessária participação ativa do mediador, que se vincula às pessoas, as legitima e, assim, assume um papel de neutralidade. Contudo, é necessário não ultrapassar determinados limites, a fim de não comprometer o trabalho em curso. Isso pode ocorrer, embora não seja um fator determinante, quando o mediador conhece uma ou ambas as partes envolvidas no conflito. Essa situação exige que o mediador também tenha uma plasticidade egóica e realize um esforço adicional para manter uma distância ótima, que garanta a continuidade do processo.

A supervalorização por parte do mediador da questão a ser discutida, sobretudo quando se trata de um tema que se contraponha aos seus valores, bem como quando o mediador se identifica com uma das partes, inclusive de formainvoluntária ou inconsciente, faz com que haja uma interferência na sua relação com os sujeitos e a possibilidade de manter-se na “posição do meio” fique comprometida.

Entendemos que o domínio de outras formas de abordagem podem também interferir no momento da mediação, se o mediador não estiver atento às suas próprias intervenções. Não raro ocorre de o psicanalista se sentir compelido a fazer uma interpretação – que no contexto analítico seria pertinente e muito bem vindo -, mas que no decurso da mediação se mostra totalmente inadequado. Essa mistura de funções, quando persiste, torna-se um obstáculo para que o mediador assuma o lugar do terceiro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Aréchaga, P., Brandoni, F. e Finkelstein, A. Acerca de la Clínica de Mediación: relato de casos. 1ª ed., Buenos Aires: Librería Histórica, 2004.

Entelman, Remo F. Teoría de Conflictos: hacia um nuevo paradigma. Barcelona: Gedisa Editorial, 2002.

Fischer, R. Ury, W. e Patton, B. Como Chegar ao Sim: a negociação de acordos sem concessões. 2ª edição, Rio de Janeiro: Imago Ed., 2005.

Deixe uma resposta